por Xúnior Matraga

Estamos em busca de quê? Caminhamos em qual direção? Não me venha com qualquer coisa, não me interessa qualquer lugar, não me serve qualquer resposta. É preciso caminhar com algum propósito, ter alguma consciência, apontar para alguma direção. Se o que procuras ainda não tem nome e não se encontra em canto algum, invente este nome, crie este lugar, seja o que procura, mas não pare. Porque entre a brutalidade da vida e a sensibilidade da existência existe uma linha invisível sobre a qual se equilibra a fé – algo perto da inconstância, mas também da leveza, algo próximo do bem-estar, mas também da angústia. Algo que a alma é capaz de tocar, mas o corpo, quando muito, só consegue sentir.
Quase todo mundo está em busca de alguma coisa, tem alguma questão, enfrenta algum conflito. Eu também. Este mundo não é mesmo para amadores, estamos todos adoecidos das inconsistências dos discursos, da frieza das autoridades e da superficialidade dos amores. Somos incapazes de compreender os sinais do universo, os avisos do corpo e do espírito, os recados da natureza. São tantas guerras no mundo, que naturalizamos o ódio sem perceber e, talvez por isso, alimentamos esta estrutura que sabemos ser absolutamente insustentável, mas seguimos, alienados, como se tudo caminhasse na direção certa. A verdade é que pisamos sobre os destroços do caos que causamos, feito um amontoado de lixo que não se recicla e acumula por todos os lados, dentro e fora de nós.
Será preciso uma revolução, uma revolta coletiva. Manifestos, outdoors, gritos entusiastas e canhões que atirem flores e manchem de poesia o corpo nu dos desonestos, dos insensatos, dos desumanos e dos descoraçados. É isso. Corram para as ruas, encontre seus pares, levantem suas bandeiras, pintem seus cartazes, declamem suas poesias, vistam-se de paz. Abrace o seu irmão, águe uma planta, acolha um bichinho, adote uma criança. Esta é a revolução da simplicidade que importa. É tempo de curar a alma e reiniciar o processo, desnaturalizar o absurdo e resgatar a elegância da educação e a delicadeza dos gestos empáticos. É tempo de ser e fazer com que a nossa existência valha à pena.
Esta semana escutei uma frase que mudou muita coisa em mim e talvez meu devolveu alguns sentidos importantes para iniciar esta revolução: “não somos seres humanos em busca de uma experiência espiritual, somos seres espirituais vivendo uma experiência humana.” E entender isso faz toda a diferença.
*Texto escrito em Unah Piracanga (Sul da Bahia) e dedicado a todos os facilitadores e amigos de imersão que criaram ao meu lado e comigo um círculo de afeto e esperança e devolveram a mim a poesia da criança que fui e que sou.
Imagens da guerra
Quando a guerra chegou arrombando janelas e portas
havia uma poesia sobre a mesa,
uma senhora na varanda
e uma criança no quintal.
Tanques enormes disparavam onomatopeias explosivas e ensurdecedoras.
Homens de fardas davam cabo de vidas infrequentes e casuais,
feito coisas sobre as quais se atiram por entretenimento ou distração.
Armas, fogo, bombas e pedaços estilhaçados de casas e pessoas agora ausentes do mundo e dos seus.
Quando a guerra chegou arrombando janelas e portas
quase tudo foi destruído
o coração de alguns agora expostos
vísceras e sangue
Humanidades escusas, dignidade assaltada
o inferno por todos os lados
Quando, no entanto, tudo teve fim,
embora uma guerra jamais termine,
uma senhora sorriu, em meio ao caos,
ao ver uma criança lendo uma poesia no quintal.
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Last modified: 19/08/2025