Crônicas semanais por Emerson Leandro Silva

SOBRE O EGO E A ESSÊNCIA DO PONTO DE VISTA
Fui acordado esta manhã por um pensamento inquietante:
“E se o que aquele coach diz sobre felicidade e sucesso começar a fazer sentido para mim, mesmo eu sendo parte do coro que não morre de amores por essa abordagem?”
Estou na casa dos 40 e poderia simplesmente ignorar esse incômodo, atribuindo-o à famosa crise da idade. Mas, se assim fizesse, estaria sendo leviano. O que realmente me chocou foi perceber que esse pensamento confrontava o meu ego.
**”Não concordo com uma palavra do que dizes, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-las.”
Não é que eu concorde com tudo o que eles pregam. Afinal, reduzir um segmento profissional ou ideológico a um único rótulo já foi responsável por momentos devastadores na história, tanto no Brasil quanto no mundo. Certamente há profissionais bem-intencionados e capacitados nessa área, assim como há os oportunistas e despreparados que vendem frases vazias em troca de atenção.
A presunção da inocência deve ser nosso filtro ao nos depararmos com alguma dessas “pílulas de sabedoria” — seja por acaso, seja pelo capricho de um algoritmo. A partir daí, cabe a nós avaliar se aquilo faz sentido, verificar se quem diz compartilha algo em comum com nossas experiências ou aspirações. O que for útil, testamos. O que não for, descartamos. E deixemos para a justiça julgar o que ultrapassa os limites da ética ou da lei.
O ruído que domina grande parte das mensagens na internet reflete uma tendência que também se espalha no mundo offline: temos pressa, cada vez menos paciência para ouvir o outro. Essa postura compromete a profundidade do nosso olhar sobre a vida.
Acho que nossas inseguranças gritam sempre que nos deparamos com algo que ameaça nossas certezas. Mas, se nosso objetivo é crescer, ser feliz ou bem-sucedido — seja lá o que isso signifique para cada um —, precisamos estar dispostos a desafiar nossas convicções. Ouvir com paciência o diverso, deixar muito claro o que pensamos a respeito e se dispor a escutar perspectivas diferentes da nossa, sem medo de mudar de ideia quando necessário.
No fim das contas, como bem disse Leonardo Boff, “nosso ponto de vista é apenas a vista de um ponto.”
**A frase é frequentemente atribuída a Voltaire, mas, na verdade, não foi dita por ele. Ela foi escrita por Evelyn Beatrice Hall, uma biógrafa britânica, no livro The Friends of Voltaire (1906).
Last modified: 23/03/2025